quinta-feira, 14 de julho de 2011

Estratégias e táticas


Napoleão Bonaparte, considerado um dos maiores estrategistas militares de todos os tempos, era um entusiasta da prática enxadrística, tendo inclusive disputado uma partida contra o autômato Turco.


A estratégia enxadrística consiste em definir e atingir objetivos de longo prazo durante uma partida – por exemplo, onde posicionar diferentes peças – enquanto a tática se concentra em manobras imediatas no tabuleiro. Estas duas partes do pensamento enxadrístico não podem ser completamente separadas, uma vez que objetivos estratégicos são atingidos principalmente por meio de táticas, enquanto a razão de ser das táticas é baseada em uma prévia estratégia de jogo.

Fundamentos da estratégia

A estratégia enxadrística está voltada para a avaliação de posições no tabuleiro e com o estabelecimento de metas a serem atingidas. Durante a avaliação, os enxadristas devem levar em conta o valor das peças, a estrutura de peões, a segurança do rei, domínio espacial e o controle de casas-chave ou grupo de casas (como, por exemplo, colunas e diagonais abertas, casas brancas ou negras).

A avaliação mais básica é a contagem do valor total de peças de ambos os lados. Os valores de cada peça são normalmente estimados em: um ponto para os peões, três pontos para os cavalos e os bispos, as torres com cinco pontos e a dama com nove pontos. Nos finais, o rei é geralmente mais poderoso que uma peça menor (cavalo ou bispo), todavia, menos forte que uma torre, então o seu valor de combate às vezes é estimado em quatro pontos. Outros autores afirmam que, na verdade, o rei tem valor absoluto, uma vez que perdendo se ele, perde-se a partida. Estes valores básicos podem ser facilmente alterados por outros fatores, tais como posição das peças (por exemplo, um peão avançado vale muito mais que um peão em sua posição inicial), coordenação entre peças (por exemplo, um par de bispos podem ser muito mais facilmente coordenados que um bispo e um cavalo – por este motivo alguns autores consideram os bispos como valendo três pontos e meio), ou tipo de posição (geralmente cavalos são melhores em posições fechadas e bispos em posições abertas).
Outro importante fator na avaliação de posição em uma partida é a estrutura de peões. A estrutura de peões é relativamente estática e sua conformação deve estar de acordo com a orientação estratégica que um enxadrista está seguindo no transcorrer de um jogo. Fraquezas nesta estrutura, tais como peões dobrados, isolados ou atrasados são, na maioria das vezes, de natureza permanente e devem ser sempre evitadas.



Partida de xadrez ao vivo, onde as peças e peões são representados por atores, na cidade de Monselice, Itália(2004).


Fundamentos da tática

No enxadrismo, táticas em geral se concentram em ações de curto prazo e podem ser calculadas precisamente por um enxadrista ou um programa de computador. O alcance do cálculo vai depender das habilidades do enxadrista ou da velocidade do microprocessador. Em posições normais com muitas possibilidades de respostas a lances para ambos os lados, um cálculo preciso não é possível, enquanto que em uma posição tática com um limitado número de variantes forçadas, é possível calcular uma longa sequência de lances.
Ações táticas simples de um ou dois movimentos – ameaças, trocas de material, ataque duplos, dentre outros – podem ser combinadas em variantes mais complicadas, denominadas manobras táticas, que freqüentemente forçam um dos oponentes a seguir uma determinada linha de jogo desvantajosa. Teóricos descreveram diversos métodos táticos elementares e manobras típicas, tais como sacrifícios, cravaduras, garfos, ataques descobertos simples e duplos (especialmente xeques descobertos), desvios, interceptações e lances intermediários.

Uma variante forçada que é conectada com um sacrifício que resultará em uma vantagem tangível é denominada combinação. Combinações brilhantes – tais como aquelas na presente na Partida Imortal – são descritas como belíssimas pelos especialistas e admiradas pelos amantes do xadrez. A habilidade de encontrar uma combinação em uma dada posição é também muito comum nos problemas de xadrez e muito desejada nos enxadristas que desejam ampliar o seu nível de jogo.

Fases da partida

Em razão dos diferentes padrões de estratégia e tática, uma partida de xadrez é normalmente dividida em três fases distintas: a abertura, usualmente os vinte cinco primeiros lances, quando os enxadristas desenvolvem os seus exércitos e definem o início dos combates; o meio-jogo, a fase de maior desenvolvimento das peças; o final, onde a maioria das peças, de ambos os lados, já foram capturadas e os reis iniciam uma participação ativa no jogo.

Começo de um tabuleiro de xadrez.abcdefgh
8torre preta em a8cavalo preto em b8bispo preto em c8dama preta em d8rei preto em e8bispo preto em f8cavalo preto em g8torre preta em h88
7peão preto em a7peão preto em b7peão preto em c7peão preto em e7peão preto em f7peão preto em g7peão preto em h77
66
5peão preto em d55
4peão branco em c44
3cavalo branco em f33
2peão branco em a2peão branco em b2peão branco em d2peão branco em e2peão branco em f2peão branco em g2peão branco em h22
1torre branca em a1cavalo branco em b1bispo branco em c1dama branca em d1rei branco em e1bispo branco em f1torre branca em h11
abcdefghFim do tabuleiro de xadrez.
Abertura Réti, um dos principais sistemas de abertura hipermodernos, criado por Réti.


Abertura

A abertura é a fase da partida que contém o grupo de movimentos iniciais das brancas e das negras. Sequências consagradas de movimentos iniciais das brancas são denominadas também de "aberturas" e, quando efetuadas/repetidas pelas negras, são denominadas de "defesas" e são comumente conhecidas por nomes de enxadristas, algumas vezes é nomeada pelo enxadrista que popularizou ou publicou uma análise sobre ela, tais como Abertura Réti ou Defesa Câmara, sendo também catalogadas em obras de referência como a Encyclopaedia of Chess Openings.

Existem centenas de diferentes aberturas e defesas, variando em características, desde o jogo posicional até lances bastante agressivos. Os enxadristas profissionais necessitam de anos de prática e estudo para domina-las completamente e continuam aprimorando esse conhecimento durante toda a carreira, uma vez que a teoria enxadrística sempre está evoluindo com o acréscimo constante de novidades teóricas.
Os objetivos estratégicos fundamentais da maioria das aberturas e defesas são bastante similiares:

  • Desenvolvimento: posicionar as peças (em particular bispos e cavalos) em casas-chave, onde possam exercer grande impacto no decorre da partida;
  • Controle do centro: controlar as casas centrais permite que as peças sejam movidas para qualquer parte do tabuleiro;
  • Segurança do rei: conseguida normalmente via roque (também chamado de encastelamento do rei);
  • Estrutura de peões: enxadristas experientes evitam a criação de fraquezas na estrutura de peões, tais como peões dobrados, isolados, atrasados ou presos.


A Partida Imortal, disputada pelo célebre enxadrista Adolf Anderssen e Lionel Kieseritzky em 1851 e repleta de belíssimas combinações envolvendo sacrifícios.


Meio-jogo

O meio-jogo é a fase da partida onde as peças em sua maioria já alcançaram o seu maior desenvolvimento, dependendo, todavia, em como foi conduzida a abertura ou defesa escolhida por cada enxadrista. Por esta razão, o estudo da teoria das aberturas e defesas deve estar em harmonia com a preparação de planos estratégicos que resultam em um meio-jogo esperado.
O meio-jogo também é a fase na qual a maioria das combinações pode acontecer. Combinações de meio-jogo estão frequentemente conectadas com o ataque ao rei oponente; alguns padrões típicos possuem seus próprios nomes, por exemplo, Mate de Boden ou Combinação Lasker-Bauer.

Outra importante questão do meio-jogo é quando e como reduzir o material disponível e entrar na fase final da partida (esta redução de material é denominada de simplificação). Por exemplo, pequenas vantagens materiais podem ser transformadas em vitória somente em um final de jogo bem conduzido e para isso, o lado com a pequena vantagem deve procurar um meio para efetuar a simplificação e obter um final favorável. Entretanto, nem todas as reduções de material são adequadas para este propósito, por exemplo, se um dos lados possui um bispo de casas claras e o oponente possui um de casas escuras, a simplificação para um final de bispos e peões é geralmente vantajosa para o lado mais fraco, uma vez que finais de bispos de cores opostas normalmente terminam em empate, mesmo com a vantagem de um ou dois peões.


Começo de um tabuleiro de xadrez.abcdefgh
8rei preto em c8torre preta em e8bispo branco em f88
7bispo preto em b7cavalo preto em e7dama branca em g77
6peão preto em f6peão preto em g66
5peão preto em a5peão preto em c55
4peão branco em a4peão preto em b4peão branco em c44
3peão branco em b33
2peão branco em b2peão branco em f2peão branco em g2peão branco em h22
1torre branca em d1rei branco em g11
abcdefghFim do tabuleiro de xadrez.
O final da partida disputada entre o físico Albert Einstein e Robert Oppenheimer, o pai da Bomba Atômica. Oppenheimer desiste da partida após o lance seguinteBxe7 feito por Einstein (Princeton, 1933).


Final

O final da partida é a fase onde somente há algumas poucas peças e peões no tabuleiro. Existem três diferenças principais de estratégia entre os estágios iniciais da partida e nos finais:
  • Durante o final, os peões se tornam mais importantes; os finais frequentemente transcorrem em torno da busca pela promoção de um peão à dama assim que a oitava fileira é alcançada;
  • O rei, que foi protegido durante todo o meio-jogo, agora torna-se uma forte peça e deve ser logo trazido ao centro do tabuleiro, onde poderá proteger seus próprios peões, atacar peões inimigos e limitar os movimentos do rei oponente por meio da oposição;
  • Zugzwang, uma desvantagem causada pela obrigação de efetuar um lance, é normalmente um fator importante nos finais e raramente nas outras duas fases de uma partida.

Os finais podem ser classificados de acordo com o tipo de peças que restam no tabuleiro. Mates básicos ocorrem em posições no qual um dos lados tem somente o rei e o outro lado tem somente uma ou duas peças e o mate é possível com o apoio do rei à peça; já finais de rei e peão ocorrem quando há somente rei e alguns peões em um ou nos dois lados e aqui o objetivo é promover um dos peões para entrar numa posição de mate básico; outros finais complexos envolvem outras peças como damas e/ou torres.